Marco Aurélio cresceu no Morro da Formiga, onde o horizonte parecia limitado pelas dificuldades e pela falta de oportunidades. A mudança veio quando descobriu o Circo Escola, um espaço onde aprendeu não apenas técnicas circenses, mas também encontrou um novo sentido para sua vida. O circo se tornou um caminho de transformação e pertencimento, permitindo-lhe superar barreiras físicas e emocionais. A cada apresentação e treinamento, ele percebeu que aquele espaço era muito mais do que um palco: era um portal para a liberdade e o autoconhecimento.
Hoje, Aurélio é um agente de mudança à frente do Circo Social no Cultura na Faixa, da ONG Se Essa Rua Fosse Minha (SER). Seu objetivo é levar essa experiência para mais jovens das periferias, oferecendo um espaço onde possam sonhar e construir novas possibilidades. Ele acredita que a cultura é um direito fundamental e que o circo, ao integrar arte e comunidade, pode abrir caminhos antes inimagináveis.
Cultura na Faixa: Marcos, gostaríamos de entender como tudo começou. Como foi que você se viu envolvido no universo do Circo Escola?
Marco Aurélio: Bem, aos 17 anos, eu vivia na comunidade, na Tijuca, no Morro da Formiga. E percebi que aquele cenário já não me trazia grandes expectativas, sabe? De conhecer o mundo, novas realidades, outras pessoas. A mesmice me incomodava. Sempre ouvia falar da grande cidade que via de cima, mas não tinha acesso a ela, até porque, desde pequeno, aprendi que as ruas não eram para mim por conta da violência.
CF: E o que te atraiu no circo? Como foi o primeiro contato?
MA: No meio disso, percebi que algo me chamava, que me libertava. Vi jovens praticando habilidades e fazendo coisas que pareciam surreais, e aquilo me motivou. Mas, no primeiro contato, eu me senti muito confuso, sem saber o que estava buscando e para onde ir.
CF: E como foi a sua trajetória dentro do circo? Como você lidou com essa dúvida inicial?
MA: No início, eu estava aprendendo as técnicas e também a dominar as minhas dificuldades físicas. Comecei a treinar teatro e percussão, depois escolhi o circo e me apaixonei. A cada salto, a cada movimento, me sentia mais livre e percebia que aquele espaço não era apenas técnico, mas também uma forma de me conectar com outras pessoas e outras realidades.
CF: Então, para você, o circo se tornou mais do que um aprendizado técnico, não é?
MA: Com certeza. O circo se tornou uma forma de aprendizado social. Ele me ensinou a ter segurança, a trabalhar minhas emoções, a me expressar, além do domínio das técnicas. Ele me proporcionou um espaço para me encontrar dentro de mim mesmo, entender o que eu realmente queria e como poderia alcançar isso.
CF: E qual foi esse ponto de virada? O que te fez abraçar de vez a ideia de fazer do circo um caminho profissional?
MA: Em uma reunião, pouco mais de dois anos depois de ter entrado no circo, com uns 19 para 20 anos, percebi que aquele grupo de jovens que fazia parte do projeto tinha um diferencial. Eles já possuíam habilidades técnicas de circo, faziam apresentações e circulavam pelo espaço profissional. Foi aí que percebi que minha comunidade, minha realidade, já não me contemplava mais. Naquele momento, eu me permiti ir além, viver aquilo intensamente. E entendi que a liberdade que o circo me proporcionava era o que eu realmente buscava.
CF: Então, hoje você se considera um profissional do circo?
MA: Sim, me encontrei no circo. Desde o primeiro contato, com o apoio dos arte-educadores, passei a desenvolver minhas habilidades com mais consciência. Aprendi que não era apenas técnica, mas também uma forma de me expressar, de me conectar com outras pessoas e realidades, e de inspirar outros.
CF: E como você se vê no futuro? Qual a sua visão de futuro dentro do Circo Escola?
MA: Ah! A partir daquele momento, tudo começou a fazer sentido. Pude viver a ludicidade dos treinos, a importância de construir junto, do acolhimento que nos ofereciam, mas também aprendi que podemos e devemos ter nossa própria voz e defender nossa liberdade. O circo me ensinou a gostar de gente e que, através da arte, podemos nos reconhecer. O que me motiva todos os dias é saber que, por meio do circo, sou capaz de ser o que quiser. Meu maior desejo é continuar fazendo isso: mostrando que podemos nos libertar das nossas dificuldades.



